sexta-feira, 21 de abril de 2017

Eu não dava para a "pastilha"

Ontem foi dia de exames pós-quimio/pré cirurgia. Entre eles está incluída a Ressonância Magnética, ou como gosto carinhosamente de a chamar, a "máquina do Demo"!!

E não, não sou claustrofóbica, por isso não é a parte de estar enfiada dentro de uma cuba de máquina de lavar roupa tamanho XL que me incomoda. É tudo o resto.

Fazer uma ressonância magnética às maminhas traduz-se numa hora de pura animação! Deitada de barriga para baixo, numa maca ao estilo do melhor Spa, com o pormenor de, para além do buraquinho para colocarmos a cara, existir um buraco extra para as maminhas que ficam tristemente penduradas, tentando em agonia resistir à força da gravidade (como se ainda fossem capazes!) durante aquela longa hora. 

Ali ficamos com os bracinhos esticados bem para a frente como se fossemos uma Super Mulher prestes a levantar voo. O pior é que para além de estarmos enfiadas na tal cuba, em vez de uma capa digna de super herói põem-nos apenas uma batinha pelas costas para não ter frio. Claro que nestas condições nem nós, Super Mulheres, conseguimos levantar voo dali para fora! Há mínimos!

Depois começa então a animação! Uma hora inteirinha de house-trans-techno-psicadélico! Uma rave privada, preparada só para nós! Agradeço a atenção mas nunca fui dada a raves. Não aprecio o estilo e estou velha e cansada. Não dá para mudar para o Panda e os Caricas? Ultimamente tem sido mais a minha onda e sempre cansa menos esta cabecinha já exausta. 

Ao fim de dez minutos a posição é cada vez mais agradável. Para quem já para lá de dois meses que não sente a ponta dos dedos, estar mais de 5 minutos com os braços esticadinhos para a frente é tão agradável como andar sobre brasas (sim, já desisti da ideia da carreira de fáquir para rentabilizar o facto de também não sentir os pés). Escusado será dizer que ao fim de uma hora temi que os meus braços tivessem apodrecido durante o processo e fossem separar-se dos ombros quando me levantasse. Da ponta dos dedos ao cotovelo não sentia uma única célula. Irónico é o facto de no início me terem posto uma borrachinha na mão para apertar caso estivesse aflita! Boa estratégia amigos!! Dou um prémio a quem ao fim de 10 minutos ainda for capaz de mexer os dedinhos para apertar o botão de pânico.

E claro, para terminar este cenário fabuloso, há ainda o extra de após a quimioterapia não termos pelos no nariz. E o que é que isso tem a ver? Tudo!! Ali, no meio da nossa rave forçada, sem nos podermos mexer, fungar, espirrar ou tossir, sentir as pingas a escorrer pelo nosso nariz abaixo, ficando alguns instantes a dançaricar na ponta do nariz (devem gostar da onda trans-psicadélico) , antes de culminarem num "splash" na pocinha que se vai acumulando logo abaixo da nossa cara é o toque de mestre para tornar isto tudo ainda mais agradável!

Mas no final do dia a boa notícia é que o cancro gostou do paclitaxel ainda menos que eu! 😀





sexta-feira, 14 de abril de 2017

Vai ser a pura da loucura!

É verdade, acabou a quimioterapia!!!! Mas calma aí que ainda vai circular muito químico por este corpo!

Com a última dose de Paclitaxel foi-me apresentado o meu novo amigo, o Zoladex. Basicamente não é mais que um implante que é colocado na barriga e que vai libertando lentamente um fármaco chamado goserrelina (usando para isso a tal seringa que gosto de apelidar como sendo do tipo "seringa para fazer farturas", tal é a delicadeza da sua agulha). O objectivo final será reduzir os níveis de estrogénio no corpo, uma vez que o meu tumor é hormonodependente e a presença de estrogénio e progesterona no meu organismo irá potenciar o seu crescimento. 

Uma vez por mês, durante os próximos 2 ou 3 anos (confesso que desliguei o chip na consulta quando começámos a falar desta parte. É durante uma data de tempo, who cares!) lá irei ao hospital para mais uma dose. 

Se já estava maravilhada com este meu novo amigo, ainda mais fiquei quando li a bula. Sim, eu sei que a ignorância é uma bênção e há coisas que mais vale não saber. Mas é mais forte que eu! Vícios de nerd. Tenho que saber o que estou a tomar, porquê e como actua. E claro, conhecer todos os efeitos secundários possíveis!

E passo a citar alguns: "Afrontamentos e sudorese. Ocasionalmente estes efeitos secundários podem continuar durante algum tempo (possivelmente meses) após interrupção do tratamento com goserrelina; Perda de cabelo (pilosidade corporal); Formigueiro nos seus dedos das mãos ou dos pés; Dor nas articulações."

Hmmmmm... Assim de repente, sem pensar, diria que já vi isto antes quando fazia uma coisa que se chama quimioterapia. Ok, pelo menos não é nada de novo! Been there, done that! Pior não há de ser!

Mas houve um que me chamou a atenção, até porque o Tico e o Teco já não andam a carburar bem: "Problemas psiquiátricos designados por perturbações psicóticas que podem incluir alucinações (ver, sentir ou ouvir coisas que não existem), perturbações no pensamento e alterações de personalidade."

Eh lá!!!! É desta que eu frito!

Felizmente o meu amigo Ernesto, que é um elefante com estudos e sensatez, estava comigo e chamou-me logo a atenção para a última frase: "Esta situação é muito rara". Foi um alívio! Era agora o que mais me faltava do que andar maluquinha a ver e falar com coisas que não existem! Brindámos com o nosso batido de banana e continuámos no nosso convívio matinal. 

Ainda bem que o Ernesto passou cá por casa para o pequeno almoço! Ufa, quem tem um elefante rosa como amigo tem tudo!


Fonte: Pinterest


quinta-feira, 13 de abril de 2017

Querido Universo

Será que posso ter direito a um dia de festejo e alegria sem que tu me arranjes mais qualquer coisinha para me lixar (com F)????? 

Ainda não me vi livre do cancro, ainda tenho um longo caminho pela frente de cortes e costuras, drenos, injecões mensais com a seringa das farturas, radiação diária, comprimidos e menopausa mais que precoce.... 

Mas será que eu podia comemorar sossegada a minha última sessão de quimioterapia???

Não!!! O Sr Universo decidiu que o vírus jeitoso que a filhota trouxe do infectário era uma cena fixe para juntar aos efeitos secundários da quimio. Já que era a última, tinha que ser a doer!

Por isso, ó Universo, fala lá com os teus santinhos, estrelinhas, unicórnios cintilantes ou seja lá o que for que decide o meu destino e dá lá uma folga a esta criatura, tá??

Eu bem que ando sempre a dizer a uma certa pessoa que tenho que ir alinhar os chakras e mudar-lhes o óleo! Só não encontro é esse pacote nos serviços das oficinas e tenho medo de acabar enfiada numa máquina para me fazerem o teste aos travões. 

De qualquer forma a alegria de ter acabado o tormento da quimioterapia já ninguém me tira! E ainda tive direito a uma grande comemoração com champanhe (mas daquele sem álcool que a malta já ficou maluca só com as bolhinhas, se tivesse álcool a coisa ia acabar mal! 😀) e umas belas sevilhanas! Ora toma, vai buscar!!!

Adeus quimioterapia! Que tenhas sido a última do resto da minha vida!



segunda-feira, 10 de abril de 2017

Senhora menopausa, "choose your weapon"

Se quimioterapia já me trouxe uma menopausa antecipada, estou ansiosa por começar as injecções de Zoladex e os comprimidinhos de Exemestano que me vão acompanhar nos próximos 500 anos!

Por isso estou já a preparar-me com o kit menopausa, aprendendo com os conselhos de quem sabe! 

Primeira aquisição: um leque! Faz parte do meu imaginário de adolescente ver as senhoras de meia idade a sacar dos leques no autocarro, abanando-se freneticamente com o seu ar coradinho, mesmo que lá fora estivessem 5ºC. Na altura tinha piada não tinha?? Agora toma! O karma é uma cena lixada! 

Este leque vai ser o meu melhor amigo e acompanhar-me para todo o lado (acho que vou até dormir com ele porque, pelos menos por agora, os senhores afrontamentos são cobardolas e preferem atacar  pela calada da noite...)! 

Bora lá ó afrontamentos, escolham as vossas armas que aqui a brasa está pronta por espalhar calor por essas ruas! 😀

Com sorte ainda me entusiasmo e aprendo a dançar sevilhanas!!! 



sábado, 8 de abril de 2017

O cheiro a palha...

Explicou-me em tempos alguém que sabe do assunto que, quando os cavalos percorrem os últimos quilómetros de uma caminhada, têm sempre uma energia extra, vinda da motivação de reconhecer que estão quase de volta à sua cavalariça fofinha e confortável (diz-se que já sentem o cheiro a palha).

Assim estou eu! (calma, a quimioterapia não me está a transformar num equídeo! O cabelo já cresceu bastante mas daí a ter crinas ainda vai um longo caminho!).

Estou assim porque, apesar de estarem piores que nunca, já me estou a borrifar para os efeitos secundários da quimioterapia! E porquê? Porque já só falta UMA!!!! 

Tenho uma unha do pé a apodrecer e cair, mas isso até pode trazer uns bons descontos na pedicure (até porque é a unha grande que é a que leva mais verniz). Desconfio que algumas das unhas das mãos vão pelo mesmo caminho por isso talvez ainda consiga negociar um preço mais jeitoso. 

Dói-me tudo, mesmo tudo, mas isso só me faz ter um conhecimento profundo do meu corpo. Sei que neste momento o meu corpo tem exactamente 103485964578631 células. Como sei? Doem-me todas!

Os afrontamentos estão cada vez mais frequentes. Vantagens? Mesmo que esteja frio, posso sempre fingir durante aqueles minutinhos de calor abrasador que estou algures nos trópicos, de papo para o ar a ver as palmeiras. A sensação de queimadura por escaldão que tenho na pele ajuda a reforçar esta sensação! Tragam-me lá uma tequila sunrise "fáxavore"!

Prevejo também que no próximo inverno possamos poupar alguma energia em aquecimento pois eu não só tenho calor como irradio mais calor que um Hot Spot ligado no máximo.

A neuropatia periférica está cada vez pior. Não só tenho mãos e pés dormentes como sinto formigueiro e uma espécie de choques nos pés. Nesta não vejo grande vantagem. Talvez tente uma curta carreira como faquir e tente andar sobre brasas mas isso ainda é uma questão a ponderar. 

Estou cada vez mais tola (ou, usando um eufemismo, com névoa de quimioterapia). A grande vantagem é que tanto me esqueço das coisas boas como das coisas más. Às vezes assusto-me com a pessoa careca que aparece no espelho..."Mas porque raio é que rapei o cabelo e as sobrancelhas? Ah, é verdade, tenho cancro.). De qualquer forma sempre achei que as pessoas mais tontas eram as mais felizes. A ignorância é uma benção.

E sabem que mais? Já só falta UMA!!!!!!! Ao fim de quase seis meses, 15 sessões de químicos corrosivos a passear pelas minhas veias, aproxima-se a derradeira!

Claro que é apenas o fim desta fase. Ainda lá vem a cirurgia, radioterapia e anos infindáveis de injecções e comprimidos.
Mas, já diziam os meus queridos Monty Phyton, há sempre que olhar para o lado positivo das coisas! (e propositadamente coloco não o vídeo original do filme mas a versão sing along para cantarem bem alto!!)

Some things in life are bad,

They can really make you mad.
Other things just make you swear and curse.
When you're chewing on life's gristle,
Don't grumble, give a whistle!
And this'll help things turn out for the best 
And 
Always look on the bright side of life!
(...)
I mean, what have you got to lose?
you know, you come from nothing
you're going back to nothing
what have you lost? Nothing!







segunda-feira, 3 de abril de 2017

Do melhor que o cancro me deu...


É verdade, o malvado também nos pode dar coisas boas (pronto, agora é que a gaja pifou, com o tico e o teco a boiar nos químicos! Mas realmente o cancro também tráz coisas boas de atrelado!).

Este fim de semana vivenciei o que de melhor há no mundo. Fui jantar com o gang do cancro. E foi tão bom!!! 

Hoje percebi que parecia uma coisa estranha quando me perguntaram: "ah, foste sair com as pessoas que fazem quimioterapia contigo e assim? Conheceram-se nos tratamentos?". Ao que eu respondi: "Não, são as minhas amigas do Facebook!! (ao dizer estas palavras percebi que soa assim a uma cena um bocado para o esquisita que mais uma vez pode levar tudo pensar que já queimei o fusível!! A Ana antes do cancro pensaria: "amigas da Internet, que disparate! Está armada em adolescente que recuou aos tempos do IRC e foi jantar com uma data de estranhas que podiam mais era querer gamar-lhe um rim ou dois!). 

Mas não! Não só saí de lá com as peças todas (coisa que daqui a umas semanas já não poderei dizer), como saí ainda mais rica e de coração cheio!!

Que bem sabe rir, dançar a abraçar alguém que acabámos de conhecer e sentir que somos amigas desde sempre! Que temos uma gargalhada cúmplice! Que conhecemos as dores umas das outras sem sequer termos que abrir a boca.

E que bom foi ver um grupo de Mulheres tão PODEROSAS!!! Quando todos os dias vemos tanta gente desperdiçar os seus dias com pensamentos mesquinhos, invejas e sentimentos tóxicos, que bom é ver um grupo de Mulheres, que teriam todas as razões do mundo para estar zangadas com a vida, a desfrutá-la no seu expoente máximo. E a gozar de um momento tão legítimo e sincero em que cada uma de nós apenas deseja o melhor para todas as outras.

Minhas Amigas, obrigada!!!!! Levantaram-me o astral como ninguém! Ando com um sorriso na alma e o coração quentinho! Como bónus acho que senti o sr cancro a mirrar com tanta gargalhada (é que ele não gosta muito de gargalhadas!). 

E para a amiga das unhas dos pés, deixo este vídeo que temos que começar a dar no duro! Para a próxima já não nos apanham de surpresa com coreografias maradas! 😏



P.S. Claro que tinha que ter o meu momento da noite em que um cavalheiro me seguiu até à casa de banho das senhoras. Porque me achou um borracho e se queria meter comigo? Não!! Porque achou que eu era um homem e que aquele era o WC masculino!!! 
Mas tudo controlado! Mais uma vez verifiquei e a quimioterapia continua só a fazer cair peças, ainda não me nasceu nada de novo!