terça-feira, 28 de agosto de 2018

Aniversário

1 ano.
A 28 de Agosto de 2017 fazia o meu último tratamento de radioterapia com um sentimento agridoce de quem chega à meta sem perceber bem qual é o prémio. De quem está feliz por ter chegado ao fim mas de repente se vê sem rede. De quem está farta de hospitais e médicos mas fica em pânico por passar mais de uma semana sem ir ao hospital nem ver um médico.
1 ano.
A 28 de Agosto de 2018 continuam os tratamentos. Porque o cancro não se cura, controla-se.
1 ano.
A 28 de Agosto de 2018 sei que odeio o cancro. Odeio o que o cancro nos faz. Odeio que ataque sem aviso. Odeio que controle tantas vidas. Odeio que leve tantas vidas.
A 28 de Agosto de 2018 morro de medo do cancro. Morro de medo que volte. Morro de medo que nunca tenha desaparecido e esteja apenas a fazer uma sesta como já o vi fazer.
A 28 de Agosto de 2018 estou farta do cancro. Estou farta de tratamentos, da menopausa precoce, das injecções com a seringa das farturas, das dores, do mau estar, das análises, dos exames, do pânico a cada sinal diferente do corpo.
Por isso, a 28 de Agosto de 2018 repete-se o sentimento agridoce. Comemoro e agradeço o privilégio de ter acesso a tratamentos que me ajudam a manter cancro sob controlo. Com a revolta e tristeza de aos 36 a vida ter achado que eu deveria aprender a (con)viver com o cancro.
1 ano já passou. Venham daí muitos mais! 

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Estou sim?

- Boa tarde, estou a falar com a Sra D Ana?
- Bom dia, está sim.
-Estou a ligar por parte da xxx e gostaria de saber se está satisfeita com os nossos serviços.
-Estou sim, obrigada.
- Óptimo! Gostaria então de lhe dar a conhecer o nosso novo sistema de assistência na doença. É muito bom, principalmente no caso de doença grave. Por exemplo doença oncológica, ....
- OK, pode parar por aí que já tenho.
-Ah, muito bem. Já tem um sistema de assistência na doença?
- Não, já tenho doença oncológica.
-(........................) OK D Ana. Agradeço a sua atenção. Se precisar de algo não hesite em contactar-nos e boa sorte.

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quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Mandei o cancro de férias

Mandei o cancro de férias.
O Facebook tem andado a chatear-me. "Olha que não dizes nada a ninguém há 42 dias" (a malta ainda acha que te deu o fanico...).
De vez em quando tenho necessidade de mandar o cancro de férias.
Já tentei mandá-lo para a Sibéria com bilhete só de ida, nadar com as baleias na costa do Alaska ou até aos nossos antípodas com direito a passagem directa pelo centro da terra.
Mas ele volta sempre.
Ou é porque tenho uma consulta. Ou porque me dói o corpo (e consequentemente a alma). Ou porque o fígado grita por socorro (já não aguenta mais viver comigo!). Ou porque as 1000 cicatrizes que me enfeitam não me deixam esquecer. Ou porque é difícil não entrar em pânico cada vez que aparece um sintoma que antes do cancro nem me faria parar para pensar mas que, depois do cancro, liga uns alarmes que o malandro activou e que gritam "Alerta Metástases, Alerta Metástases!!!".
E como estou cansada, desta vez dei-lhe um chapéu e o protector solar (que o cancro tem muito medo do sol pois ouviu dizer que pode ter um cancro e pela-se de ter que passar pelos tratamentos!) e mandei-o em busca dos encantos da silly season. Pode ser que ele se maravilhe com os sunsets, festas brancas e outras que tais e fique por lá eternamente!
Eu por cá continuo a trabalhar e a contar os dias para as minhas férias (de preferência sem o cancro atrás).
É que, parecendo que não, preciso de umas férias do cancro.

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